sexta-feira, novembro 09, 2012

Mudança de modelo económico

Nos últimos anos e no mundo da economia, não há debate, entrevista ou discurso público que não fale na necessidade urgente de uma "mudança do modelo económico".
Chegam às vezes a ser apelos desesperados ao surgimento de um modelo alternativo para o desenvolvimento do planeta ou do mundo ocidental, ou da europa, ou de portugal. Essa mudança constitui, à luz da veemência das intervenções, um verdadeiro Santo Graal da Economia. Infelizmente 99,9% das vezes nenhum dos presentes faz a mais pequena ideia de como se deve processar essa mudança nem o que dela deve constar. O único pensamento estruturado sobre este assunto é o de um movimento chamado Zeitgeist, que aproveito para publicitar um pouco e que pode ser explicado vendo os vários documentários disponíveis por exemplo no Youtube.
Mas voltando um pouco atrás, pergunto: quais são as hipóteses do mundo ocidental mudar de modelo económico, de forma pacífica ou seja sem que seja necessário algo parecido com uma revolução?
Vejamos alguns exemplos de mudanças de modelo económico, caracterizadas pelo sentido em que as mesmas se realizaram, ou seja se ocorreram no sentido de favorecer a maioria retirando privilégios à minoria, ou se foram realizadas no sentido de concentrar a riqueza nas elites dominantes. Este exercício não pretende ter em conta o que aconteceu após o momento da tal mudança, porque sabemos todos que a natureza humana ainda não evoluiu o necessário para que mesmo as mudanças no sentido favorável à maioria, não sejam aproveitadas, mais tarde ou mais cedo, para criar novas minorias de privilégio.

Até à revolução Francesa de 1789, existiram essencialmente mudanças de liderança, que ocorriam um pouco em substituição de uma ferramenta que ainda não tinha sido inventada, - as eleições democráticas. Dessa forma, através de golpes de estado, ou de lutas dinásticas, os regimes ocidentais iam-se sucedendo uns aos outros, mas sem nenhumas alterações económicas de relevo.
Em França aconteceu a primeira revolução que pretendia acabar com a desigualdade nas transferências de riqueza entre as classes sociais. Curiosamente a faísca que despoletou o movimento aconteceu quando o rei Luís XIV, decidiu cobrar impostos ao clero e à nobreza, ou seja atacou a minoria priveligiada, que depois manobrou facilmente a opinião pública e libertou a revolução. Foi um acontecimento violento, seguido de um período de extrema volatilidade, que só terminaria com a chegada ao poder de um novo Imperador, - Napoleão Bonaparte.
A próxima mudança de modelo económico aconteceu na Rússia, onde mais uma vez em nome do povo russo, os czares foram destituídos, os privilégios retirados e onde se tentou criar um forma mais justa de repartição da riqueza do país. Todos sabemos que se nos primeiros anos o projeto parecia estar em fase de implementação, logo surgiu quem se apoderasse do comando da máquina bolchevique e se transformasse num novo czar vestido de vermelho. A revolução de Outubro, foi, tal como a francesa, extremamente violenta.

A seguinte mudança de modelo económico não teve o dramatismo das revoluções anteriores, foi antes uma manobra silenciosa e ocorreu ao longo de várias décadas. Aconteceu na América. A Grande Depressão, e as reformas instituídas por Roosevelt ao sistema financeiro dos EUA, para além de salvarem o país da ruína, tiveram também a má fortuna de gerar as semente de um movimento revolucionário, que lentamente foi subindo as escadarias do capitólio com o objectivo de destruir todo o tipo de controlo que o Estado deve ter sobre a riqueza que o país produz. O processo de transformação propriamente dito, teve o seu inicio quando o presidente Reagan foi eleito e teve sequência em todos os que lhe sucederam. Ao contrário das revoluções anteriores esta mudança foi realizada de forma pacífica, organizada e muito lentamente, tendo por isso passado praticamente despercebida até ao momento em que os mecanismos, que o Estado permitiu à minoria privilegiada inventar para se apoderar da riqueza do país, se romperam e tudo se desmoronou como um castelo de cartas.
Este modelo económico Americano, criou um outro braço armado, chamado de Globalização. Com ele, a minoria privilegiada que apesar do colapso da sua doutrina, se mantém a liderar os destinos dos EUA, pretende alargar a sua área de domínio económico a todo o planeta, ou pelo menos a todos os países que não possuam capacidade militar para se lhe opor.
A desregulamentação dos sistemas financeiros nacionais, faz parte dos programas de ajustamento que o FMI, sediado e financiado pelos EUA, impõs aos imensos países por onde já passou. Se lerem o fascinante livro de Joseph Stiglitz (americano, e prémio Nobel de economia) " A Globalização" verão que os países intervencionados pelo FMI, e que decidiram ceder o controlo dos fluxos financeiros, aplicando a receita da liberalização, perderam sempre décadas até recuperarem os níveis anteriores à intervenção e muitos deles ainda nem viram, até hoje a luz ao fundo do túnel.

Os casos da França e da Rússia, mostram que efectivamente a mudança de modelo económico, tem servido ao longo dos anos apenas como uma espécie de cenoura com que as minorias privilegiadas, conduzem a maioria silenciosa. As grandes mudanças que esses 2 movimentos trouxeram ao mundo não envolveram a economia dos países, porque de uma certa forma tudo ficou na mesma, passados os tempos de volatilidade.
Ambas trouxeram mudanças significativas noutras áreas, na escolaridade, na saúde, na organização administrativa, mas o principal chamariz que os despoletou, nunca foi cumprido.

Portanto quando a nossa minoria privilegiada fala na urgência de uma mudança de modelo económico, estão a pensar exactamente em quê?
Querem o derrube do modelo americano e trilhar um rumo novo e desconhecido, ou pretendem apenas acenar com a cenoura que a França e a Rússia usaram? Precisamos de saber isso porque a maioria silenciosa já está cansada de comer cenouras...

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