segunda-feira, maio 17, 2010

Querem saber o que são os problemas estruturais da economia portuguesa?

Está na ordem do dia debater a gravidade dos problemas estruturais de Portugal e a urgência sentida para a sua resolução.
Quase nunca se explicam ou elencam quais são esses problemas e a maior parte das vezes fica-se pela visão, necessariamente estreita, da coorporação que nesse momento está a defender os seus interesses.
Quando fala um grande empresário, os problemas são sempre os elevados salários que não acompanharam a produtividade, ao qual acrescentam frequentemente o peso excessivo do Estado.
Quando fala um economista, tende a ser mais vago e opta por falar na fraca competitividade do tecido económico português e frequentemente do peso excessivo do Estado.
Quando fala um sindicalista, o problema principal passa a ser a politica de mão-de-obra barata e a protecção que o Estado faz ao grande capital em prejuizo da classe trabalhadora.
Temos para todos os gostos.

Raramente se dão exemplos, e muito mais raramente se aponta o dedo quando esses exemplos acontecem.
Ora aconteceu hoje mais um exemplo do que realmente enferma de modo absolutamente estrutural, a economia portuguesa.
Deixo agora a notícia do Jornal de Negócios de 17 de Maio de 2010, e de seguida vou tentar explicar o que ele significa.

"Entrada de accionistas na Via Verde acelera introdução de portagens nas SCUT
A entrada da Mota-Engil e da Cintra no capital da Via Verde, empresa detida pela Brisa, deverá contribuir para acelerar a introdução de portagens nas SCUT, de acordo com a análise do BPI.

Paulo Moutinho
paulomoutinho@negocios.pt

A entrada da Mota-Engil e da Cintra no capital da Via Verde, empresa detida pela Brisa, deverá contribuir para acelerar a introdução de portagens nas SCUT, de acordo com a análise do BPI.

“A entrada destas concessionárias na Via Verde deverá permitir acelerar o processo de implementação de portagens nas vias sem custos para o utilizador (SCUT)”, referem os analistas Bruno Silva e Flora Trindade.

Na edição de hoje, o Negócios revela que os consórcios Ascendi (da Mota-Engil e do BES) e Cintra/Ferrovial estão em negociações com vista à entrada no capital da Via Verde.

O montante da participação será definido de acordo com o número de transacções realizado por cada concessionária, sendo que a entrada destes novos accionistas no capital da Via Verde será efectuada no âmbito da introdução de portagens nas SCUT a partir de Julho."



A economia portuguesa é de muito pequena dimensão.
Essa pequena dimensão permite que com pouco capital se possa exercer grande poder sobre ela.
Quando se soma a essa pequena dimensão, a sistemática ausência de regulação por parte do poder político, cria-se o clima favorável para que um pequeno grupo de familias/empresas/grupos empresarais, tomem literalmenta conta do país.
As participações cruzadas das maiores empresas portuguesas, favorecem o eterno status-quo, em que o país vive talvez desde a monarquia.
Relativamente a este caso concreto, o que se está novamente a passar é que um dos maiores construtores de estradas (Mota-Engil), vai passar a ser "parceiro" do maior cliente de estradas de portugal (Brisa).
O que é que isto tem de estrutural para a economia nacional?
Tem porque vai agravar ainda mais a falta de concorrência e esse é claramente, o maior problema estutural de Portugal. Qual vai ser o rigor com que a Brisa, vai passar a analisar concursos internacionais? (veja-se já o que vai acontecer ao concurso da linha do TGV entre Poçeirão e Caia, que o próprio governo já anunciou ir anular, prejudicando a empresa FCC que o ganhou, para favorecer a empresa Mota-Engil que o perdeu).
Iremos continuar a assistir a erros de construção de estradas, obras de arte absolutamente desnecessárias, critérios ambientais neglicenciados, etc, etc. Isto porque o cliente e o fornecedor vão passar a ser da mesma "familia".
Deixa de existir mérito das propostas, economia de ganhos e ganhos de produtividade, quando as dinâmicas empresariais passam a ser geridas por interesses que nada têm a ver critérios de eficiência.
Todos sabemos o que aconteceu aos negócios familiares do comércio tradicional... Será esse o caminho que queremos para esta grande mercearia chamada Portugal?
A permitir este excessivo cruzamento de participações entre as empresas, o Estado está criar o habitat ideal para o crescimento de um super-conglomerado privado, designável por Portugal, S.A. que continuará a sugar os habitantes deste rectângulo a seu belo prazer.