segunda-feira, abril 19, 2010

Fundos Estruturais e o Deficit Português

Quando um país é governado por uma classe dirigente sem capacidade de planeamento estratégico, os factores que decidem o que se vai fazer, o que se constroi e onde se investe podem ficar reduzidos a coisas muito simples e com muito fraca correlação entre si.
Acontece que em Portugal um dos factores mais importantes para tomar decisões, sejam elas de grande ou pequeno calibre, é precisamente o facto de serem financiáveis pela União Europeia. E uma das maiores armas de arremesso com que os sucessivos governos se têm de defender é precisamente as baixas execuções do Quadro de Referência Estratégica Nacional e dos antigos Quadros Comunitários de Apoio.
Perante a pressão de gastar os Fundos que a Europa nos coloca à "disposição" em distintos níveis de co-financiamento, o Estado entra num turbilhão de candidaturas onde, com o aproximar do fim dos Quadros, se permite financiar tudo. Desde caminhos agricolas, a TGVs, ou desde aeroportos, a rotundas com chafarizes.
Este esquema permite ao Estado financiar tudo o que dirigirá o país rumo a um futuro, e ao mesmo tempo financia tudo o que dirigirá o país no rumo inverso. Tanto pode financiar, projectos que promovem a redução das emissões de gases com efeito de estufa, como se financiam projectos que os produzem. Financiam-se demolições de construções ilegais no litoral, e de seguida financia-se a construção dos novos apoios de praia.
Vale tudo e no fim do dia o que conta mesmo é gastar todas as contrapartidas financeiras do QREN, esquecendo que parte dos investimentos saem sempre do Orçamento Nacional e que portanto vão contribuir para aumentar o desequilibrio.
A lógica é a mesma que usa Homer Simpson quando vê anuncios de TV, no seu sofá, "temos desconto, vamos aproveitar". Mesmo que seja para comprar artigos de duvidosa utilidade.
Acresce a esta lógica a visão de quem promove esses descontos, ou seja a própria UE. Se formos benevolentes, podemos considerar que a intenção da Europa do Norte, era ajudar financeiramente os países com menos dinheiro, para eles criarem meios para se desenvolverem e produzirem mais riqueza. Se quisermos optar pela teoria da conspiração, eles comportam-se como meros comerciantes e os fundos apenas servem para subsidiar o consumo subsequente, porque o dinheiro que acabam por investir em Portugal, regressa ao seu dono e com juros variáveis, uma vez que quase tudo o que Portugal faz com esses fundos envolve em maior ou menor esforço novas importações que eles próprios produzem e fornecem.
Ainda esta semana li um esboço do que vai ser um novo "apoio" que a UE vai dar aos jovens e reformados mais desfavorecidos (leia-se Sul da Europa) para estes viajarem e conhecerem a Europa (leia-se Norte da Europa). São 30% de "fundos estruturais" para fomentar o gasto dos restantes 70%. Com grande probabilidade os 100% deverão encontrar abrigo num país (do Norte) que contribuiu para mais este "subsidio". Pondo por hipotese que alguns desses desfavorecidos até recorrem ao crédito bancário para financiar os seus 70%, e que foi por exemplo a uma agência do Deutsche Bank, o Norte até consegue ganhar mais de 100% graças aos juros.
Não defendo que a economia de um país deva ser totalmente dirigida pelo Estado, como nos ex-URSS, mas considero que num país pobre como o nosso, e sendo o Estado o gestor desses fundos, tem o dever moral de os investir sempre em projectos criteriosamente integrados numa lógica de propagação dos mecanismos para criação de riqueza. Gerir implica escolher. Escolher implica consequências. Importa escolher projectos e áreas com consequências positivas.
Concluo portanto que devia ser estudada e quantificada a percentagem de Deficit que foi criada directamente pela própria UE, quando induz um país membro, num estado de euforia de "saldos", no preciso momento que ele devia ser frio o programático quando selecciona os projectos de investimento mais sérios para o seu desenvolvimento.

segunda-feira, abril 12, 2010

CEO

Noticia de 12/04/2010 - Jornal de Negócios

"As comissões executivas das 17 empresas do PSI-20 que divulgaram os seus relatórios de governo corporativo acumulam, no seu total, 98 administradores, incluindo os CEO. São apenas dois executivos a mais face a 2008.


A liderar o número de administradores na comissão executiva está o Banco Espírito Santo (BES), que totaliza 11 elementos.

No outro extremo, com apenas três administradores executivos, estão empresas como a Jerónimo Martins (JM) e a Sonae Indústria. A cotada presidida por Carlos Bianchi de Aguiar apresentou, no ano passado, menos um administrador face ao ano anterior."
 
É curioso como isto bate certo com ideia que grande parte da sociedade tem das empresas mais eficientes do PSI 20. Interessa também verificar que nem a JM nem a SONI se encontram "poluídas" pelo Estado, tal como acontece com os pesos pesados do indice.
Relativamente ao BES, tão fatalmente envolvido em todo o tipo de escandalos (sobreiros, mensalão, pinochet, submarinos, etc) pode ser reflexo dos comprimissos que o grupo ES tem de fazer para ter acesso às mesas onde se decidem os negócios.

quinta-feira, abril 08, 2010

Compartimentação dos Rios

A qualidade da água degrada-se com a construção de albufeiras (passagem de massa lótica para lêntica):


EFEITOS A MONTANTE

• Aumento da acidez (por via da degradação de matéria orgânica submersa).

• Aumento da temperatura média da água.

• Dependendo da profundidade e da turbidez que se atinge na albufeira, pode haver formação de um fundo anóxico e estéril no que diz respeito a vida bentónica (macro-inventrebrados e macrófitas), que são elementos fundamentais para estruturar toda a cadeia alimentar.

• Cria as condições base para que se inicie o processo de eutrofização da massa de água, exponenciada com os fenómenos de bloom de fitoplancton, por vezes acompanhado pela toxicidade de algumas estirpes de cianobactérias.

• Erosão das margens inundadas, cujos solos tendem a desagregar-se e depositar no fundo da albufeira, contribuindo ainda mais para o aumento da matérias orgânica em degradação anaeróbia e para a disponibilização de nutrientes que aumentam o potencial de eutrofização da massa de água.

• Destruição de potenciais locais de desova da ictiofauna migradora, que existam a montante da barreira.

• Alteração do habitat ribeirinho com perda de biodiversidade.





EFEITOS A JUSANTE

• A água turbinada, que provém do fundo da albufeira, encontra-se degradada (baixo nível de oxigénio, baixo pH) – há relatos em algumas barragens, da ocorrência de corrosão ácida nos elementos metálicos do sistema propulsor, o que é revelador deste último impacte. Este facto, desconhecido por muita gente, coloca em cheque a opinião consensual de que a hidroelectricidade não é um uso que degrade da qualidade da água.

• Existe o chamado “efeito regulador” dos caudais que a armazenagem provoca. Este efeito é mais pronunciado nas albufeiras de armazenamento, por contraste com as chamadas “fio-de-água”, no entanto em tempo de estiagem pouca ou nenhuma diferença se encontra entres os dois tipos de barragem, existindo isso sim, situações de caudal zero a jusante. A questão dos caudais ecológicos vem-se arrastando sem resolução aparente pelo que é um factor cada vez mais fora da equação.

• O represamento da água significa também a interrupção do ciclo do chamado caudal sólido e mais importante que isso significa que partes significativas do curso de água deixam de produzir esse mesmo caudal sólido porque deixa de existir a erosão física. Para além da redução da erosão, a barragem vai interromper o transporte de areia, em última análise até ao litoral, agravando ainda mais os problemas associados à erosão costeira.

• A diminuição de caudais a jusante, pode interferir de forma significativa, com outros usos, (balnear, rega).



Estes efeitos negativos e graves, exigem que se estabeleçam e regulamentem muito bem as condições em que se poderão considerar viáveis empreendimentos hidráulicos nos rios do Norte de Portugal. Estas condições, de natureza ambiental, uma vez estabelecidas e validadas pela ARH, têm de ser transcritas posteriormente nos novos PBH, para ganhar ainda mais pesam na gestão dos RH.



Neste sentido e na minha opinião só devem ser considerados empreendimentos que preencham estas condições:

1. Existindo espécies migradoras, a barragem nunca poderá ter como localização, a foz de um Rio de 1ª ordem ou de 2ª ordem. Ao permitir isto, estamos a alterar de forma definitiva o acesso a todos os tributários dessa bacia ou sub-bacia, cortando partes substanciais das nossas bacias hidrográficas às rotas de migração dessas espécies. Veja-se por exemplo o que aconteceu ao sável no rio Douro quando comparada com a sua ainda existência no Cavado. São rios com um factor de poluição semelhante mas em que num deles foi criada uma espécie de cascata de barragens no rio principal (o Douro), e cuja primeira, (Crestuma) corta logo a escassas dezenas de km da foz o acesso de todos os migradores, aos afluentes mais limpos que existem a montante, condenando todas as espécies que deles necessitavam à extinção local.

2. Só deverão ser estudados como locais de potencial hidroeléctrico, os que fiquem localizados no primeiro terço de cada Bacia Hidrográfica.

3. Só poderão ser construídos aproveitamentos hidroeléctricos em bacias hidrográficas cujas zonas costeiras não apresentem já graves problemas de erosão evitando desta forma o agravamento desses problemas. Nas bacias hidrográficas onde tal problema não ocorra, tem de ser muito bem calculado o volume de caudal sólido que ficará retido na albufeira e estudado com rigor o impacte que essa retenção irá provocar na respectiva zona costeira.

4. Em função das condições anteriores, a ARH só devia permitir a criação de novas barragens na Bacia do Douro se for desmantelada a Barragem de Crestuma-Lever. Esta operação, simples de executar devido ao método de construção desta barragem, permitirá a renaturalização de 42 Km do rio Douro e acima de tudo reabrirá o corredor existente entre o oceano e rios tão importantes para a bacia hidrográfica como são o Paiva, o Inha, o Arda, e em menor grau o Tâmega que possui ele próprio na sua foz uma barragem. Repare-se que desde que a barragem foi construída, o rio Sousa, passou a ser o único afluente da bacia hidrográfica do Douro com acesso directo ao mar. Neste caso, devido à fraca qualidade da água deste rio, pouco ou nada serviu este acesso em termos de manutenção dos habitats. Abrindo o acesso aos rios menos poluídos da margem esquerda, poderemos de certa forma “ressuscitar” os ecossistemas aquáticos perdidos. À partida esta operação (totalmente inovadora) terá como principais obstáculos a refrigeração da Central Termoeléctrica da Tapada do Outeiro e a ETA da Águas do Douro e Paiva, S.A. e afectar em parte a navegabilidade do rio. Eventualmente, estes problemas poderão inviabilizar qualquer alteração da barragem, mas assim sendo, também ganharemos um argumento de peso para não permitir que nenhum outro empreendimento hidroeléctrico que não cumpra as 3 primeiras condições) se instale nesta bacia. Em alternativa ao desmantelamento, poderá ser estudada a possibilidade de durante os meses mais activos em termos de migrações, as comportas da barragem serem total ou parcialmente abertas.

5. A rendibilidade dos capitais investidos em projectos hidroeléctricos, dá às empresas concessionárias cerca de 15% de lucro anual. Ou seja, por cada euro investido na sua construção a empresa recebe todos os anos 15 cêntimos. Fazendo as contas, verificamos que em 6,6 anos os empreendimentos ficam pagos e os restantes anos de vida das barragens (que geralmente abrangem várias décadas) revertem directamente para os concessionários. Creio que a ARH tem de exigir no âmbito do Regime Económico e Financeiro da nova Lei da Água, que pelo menos, 7,5% desse lucro passe a reverter directamente para o orçamento da ARH. Talvez nessas novas condições, o futuro energético do país deixe de estar ciclicamente sujeito a tecnologias dos anos 50-70 do século passado e se olhe com mais objectividade para o futuro.



É também minha convicção que espalhados um pouco por toda a rede hidrográfica do Norte, existe um excesso de obra hidráulica que urge combater. Parte destas obras já perderam as funções para que foram erigidas, outras não se encontram licenciadas, outras são totalmente ilegais e outras ainda deverão ser bem ponderadas quando se chegar ao tempo de renovar o respectivo licenciamento. Estas estruturas que se podem considerar “lixo hidráulico” contribuem apenas para a artificialização dos cursos de água e a respectiva degradação da água e dos ecossistemas a que ela dá suporte.

A ARH tem de ser identificada na sua actividade como o agente que renaturaliza os rios seja por via da despoluição seja através do combate à sistemática segmentação a que eles têm vindo a ser sujeitos.

sugestão para o governo de Portugal

Na Lusitânia, sempre que as circunstância o exigem os Ministérios utilizam o canal de TV a quem foi contratado o serviço público, para explicar a todos os cidadãos os seus planos, as suas reformas, e todos os assuntos para os quais é fundamental esclarecer as populações. Curiosamente a iniciativa foi bem acolhida por quase todos e os programas pelo formato em que foram concebidos nunca se confundiram com mera propaganda. Inicialmente alguns tentaram traçar paralelos com outros regimes que também usam a TV para comunicar com as populações, mas com o passar do tempo e dos programas, foi sendo por todos entendido que estavamos perante algo diferente.
Os temas são pertinentes e as propostas são explicadas com muita objectividade e transparência. Talvez tenham sido estas as razões principais para sucesso que este canal previligiado de comunicação entre o Estado e os cidadãos, tem vindo a alcançar.

Sabendo que Portugal se debate com imensas dificuldades em reformar os diversos sistemas instituidos, creio que a adopção deste tipo de comportamentos perante os cidadãos poderá revelar-se extremamente útil para o progresso do País.

Em Portugal é sempre dada voz a quem protesta contra as medidas reformistas mas nunca se conhecem verdadeiramente a fundo os objectivos dessas medidas, os critérios que foram usados na análise dos problemas, os cálculos efectuados para atingir as medidas que pretendem melhorar a eficiência dos serviços.

A falta de divulgação deste tipo de informação, só dá oportunidade para que com manobras de demagogia, desinformação, desacreditação, e em última fase de levantamentos populares, se tenham inviabilizado sistematicamente todo o tipo de alteração que os governos tentam executar.

O mundo mudou muito ao longo destes anos e quando todos os sectores economicos usam exaustivamente os media para atingir os diversos públicos, é quase criminoso que o Estado, envergonhado por utilizações menos criteriosas dos mesmos, abdique de tão poderoso instrumento para comunicar com a parte mais importante de si mesma que são os seus cidadãos.